NÓS
os
MODERNOS
Images courtesy of ©Hendrik Kerstens, represented by
Nunc-Contemporary
Hendrik Kerstens
Ao chegar em casa, depois de ver um ensaio fotográfico baseado em
pessoas que acumularam os seus lixos durante sete dias, olhei o meu. E fiquei
abismada. Tinha muita coisa lá que eu nem me lembrava que consumia. Era
mais volume do que eu imaginava. Eram tantos papéis... mas nada escrito.
Assim, percebi que havia alguma coisa errada com o actual estilo de vida
da humanidade.
caroline slotte ~ trash carved from wood ♥
Algumas famílias americanas foram convidadas a acumularem uma semana
de lixo e depois serem fotografadas com ele. Esse ensaio, um tanto
curioso, foi feito pelo fotógrafo californiano Gregg Segal, intitulado
"7 days of Garbage". De um senso incrível e uma percepção melhor ainda,
capta detalhes que são batidos pela velocidade do tempo - plásticos que
são jogados na rua, muitos papéis usados por nada, a compra exagerada de
roupas que nem serão usadas, a falta de cuidado com que se alimenta -
coisas que até dão vergonha ao lembrarmos que fazem parte do nosso quotidiano.
Ao olhar as fotos, pelo menos da primeira vez, não é fácil entender o
que aquilo pode dizer sobre nós mesmos a sociedade em geral. As imagens
são capazes de trazer mais do que sentimento de repugnância, o
sentimento de espanto, e ele vem no primeiro ponto a ser observado e que
vem ao pensamento: consumimos mais do que imaginamos.
Com a correria do dia a dia, não temos mais tempo de preparar comidas
como antigamente. Apelamos para o que já está empacotado e pronto.
Descartamos tudo com muita facilidade. E tentamos cuidar muito do que
essa correria nos dá, fisicamente falando. É um produto para cada nova
manifestação de insatisfação do organismo. "Nossa, não sabia que uso
tantas coisas assim" é uma das primeiras frases despertadas pelo ensaio.
Ao levantar os olhos do computador, já pesamos na consciência quantas
coisas compramos e não precisamos, ou ainda, já temos. Os pensamentos
subsequentes são "eu preciso disso mesmo?", "nossa, como sou
consumista", e assim por diante.
Deitar no chão e ser fotografado com latas de cerveja, papéis
rasgados, rótulos de embalagens, pets de refrigerante, rejeições de
comida exorbitantes, que poderiam alimentar muitas pessoas, ainda não
são o suficiente para diminuir o ritmo de vida que vamos levando. O
nosso lixo fala muito de como somos. Fala se gostamos da espera e da
maturação, do cuidado, ou do imediatismo, do não saber esperar. Fala se
descartamos tudo sem ao menos pensar ou se tentamos dar um novo uso com
aquilo que está parado. Diz também sobre o tamanho do nosso olho ao nos
servirmos, não ponderando a quantidade de comida que vamos comer. Nós
somos nossos próprios lixos. Está certo. Há pessoas que realmente nos
fazem mal. Mas também existem pessoas que nos fazem bem. O que fazemos
com o que fazem de nós? O que refletimos a partir do que dizem?
Eu parei para pensar e vi que estava sendo meu próprio lixo. Não
estava reciclando ideias antigas, filtrando críticas não construtivas,
estava deixando tudo se acomodar, sem perceber a saturação que isso me
trazia, até perceber que ninguém mais poderia fazer essa limpa. Cada um é
responsável por aquilo que produz e alimenta, aquilo que consome e que
deixa de consumir.
O ensaio é mais uma prova de como a fotografia é um dos meios mais
impactantes que a arte tem de nos conscientizar de coisas tão triviais,
mas que abreviam nossa vida e poluem o lugar onde estamos vivendo. Esse
trabalho foi realizado no momento mais oportuno: numa era onde ninguém
dá uma parada pra ver aquilo que está produzindo. Não seja seu próprio
lixo. Analise o que está produzindo. Não seja o que você está
consumindo.
© obvious
Victória Mendes
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