LOBOS

Sou, na verdade, o Lobo da Estepe, como me digo tantas vezes – aquele animal extraviado que não encontra abrigo nem na alegria nem alimento num mundo que lhe é estranho e incompreensível

Herman Hesse

segunda-feira, 9 de maio de 2016

LIXO



NÓS 
os
MODERNOS



Images courtesy of ©Hendrik Kerstens, represented by Nunc-Contemporary
Hendrik Kerstens




Ao chegar em casa, depois de ver um ensaio fotográfico baseado em pessoas que acumularam os seus lixos durante sete dias, olhei o meu. E fiquei abismada. Tinha muita coisa lá que eu nem me lembrava que consumia. Era mais volume do que eu imaginava. Eram tantos papéis... mas nada escrito. Assim, percebi que havia alguma coisa errada com o actual estilo de vida  da humanidade.

caroline slotte ~ trash carved from wood ♥

Algumas famílias americanas foram convidadas a acumularem uma semana de lixo e depois serem fotografadas com ele. Esse ensaio, um tanto curioso, foi feito pelo fotógrafo californiano Gregg Segal, intitulado "7 days of Garbage". De um senso incrível e uma percepção melhor ainda, capta detalhes que são batidos pela velocidade do tempo - plásticos que são jogados na rua, muitos papéis usados por nada, a compra exagerada de roupas que nem serão usadas, a falta de cuidado com que se alimenta - coisas que até dão vergonha ao lembrarmos que fazem parte do nosso quotidiano.
Ao olhar as fotos, pelo menos da primeira vez, não é fácil entender o que aquilo pode dizer sobre nós mesmos a sociedade em geral. As imagens são capazes de trazer mais do que sentimento de repugnância, o sentimento de espanto, e ele vem no primeiro ponto a ser observado e que vem ao pensamento: consumimos mais do que imaginamos. Com a correria do dia a dia, não temos mais tempo de preparar comidas como antigamente. Apelamos para o que já está empacotado e pronto. Descartamos tudo com muita facilidade. E tentamos cuidar muito do que essa correria nos dá, fisicamente falando. É um produto para cada nova manifestação de insatisfação do organismo. "Nossa, não sabia que uso tantas coisas assim" é uma das primeiras frases despertadas pelo ensaio. Ao levantar os olhos do computador, já pesamos na consciência quantas coisas compramos e não precisamos, ou ainda, já temos. Os pensamentos subsequentes são "eu preciso disso mesmo?", "nossa, como sou consumista", e assim por diante.

Deitar no chão e ser fotografado com latas de cerveja, papéis rasgados, rótulos de embalagens, pets de refrigerante, rejeições de comida exorbitantes, que poderiam alimentar muitas pessoas, ainda não são o suficiente para diminuir o ritmo de vida que vamos levando. O nosso lixo fala muito de como somos. Fala se gostamos da espera e da maturação, do cuidado, ou do imediatismo, do não saber esperar. Fala se descartamos tudo sem ao menos pensar ou se tentamos dar um novo uso com aquilo que está parado. Diz também sobre o tamanho do nosso olho ao nos servirmos, não ponderando a quantidade de comida que vamos comer. Nós somos nossos próprios lixos. Está certo. Há pessoas que realmente nos fazem mal. Mas também existem pessoas que nos fazem bem. O que fazemos com o que fazem de nós? O que refletimos a partir do que dizem?
Eu parei para pensar e vi que estava sendo meu próprio lixo. Não estava reciclando ideias antigas, filtrando críticas não construtivas, estava deixando tudo se acomodar, sem perceber a saturação que isso me trazia, até perceber que ninguém mais poderia fazer essa limpa. Cada um é responsável por aquilo que produz e alimenta, aquilo que consome e que deixa de consumir.



O ensaio é mais uma prova de como a fotografia é um dos meios mais impactantes que a arte tem de nos conscientizar de coisas tão triviais, mas que abreviam nossa vida e poluem o lugar onde estamos vivendo. Esse trabalho foi realizado no momento mais oportuno: numa era onde ninguém dá uma parada pra ver aquilo que está produzindo. Não seja seu próprio lixo. Analise o que está produzindo. Não seja o que você está consumindo.

© obvious



Victória Mendes




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